Comercial Retrô AYO GG | Prima Donna, por 9MUSES

Caso vocês não saibam, paralelo aos posts que eu faço pro blog de coisas que vão saindo no pop asiático, eu me atirei numa aventura de ouvir e relembrar tudo que já foi lançado até então, pra conseguir fazer um ranking separado por décadas, começando com os anos 2010. E, nesse processo, eu descobri alguns trabalhos muito bons, acima da média e de qualquer expectativa que eu tivesse. Então, pra desovar algumas delas em forma de spoiler pra esse projeto futuro e megalomaníaco do AYO GG, de vez em quando vão surgir algumas reviews, listas, enfim, posts temáticos abordando lançamentos de anos anteriores. 

Pra iniciar os trabalhos, e testar um novo formato de fazer minhas resenhas de álbuns, resolvi pegar esse que deve ser um dos melhores álbuns de 2013 e do kpop no geral: o avassalador Prima Donna, do 9MUSES. O que pode ser meio redundante de dizer, já que o grupo deve ser um dos pouquíssimos exemplares cuja discografia é praticamente perfeita, principalmente quando falamos sobre singles. E, bom, o 9MUSES tem uma história curiosa e bem melancólica, com todo aquele problema com a Star Empire, que culminou num documentário excelente e bem cru da BBC sobre a indústria do kpop e da própria formação do 9MUSES até sua estreia (e do qual eu pretendo falar sobre um dia). 

A situação do grupo com a empresa não melhorou muito desde o fatídico 9MUSES of Star Empire, disponível no Youtube com legendas em inglês, e elas morreram no imaginário coreano sem uma vitória em programas de auditório ou números significativos nos charts (na verdade, elas até são lembradas por isso junto com outros dois atos que surgiram mais ou menos na mesma época, assunto que eu quero tratar em outra oportunidade). Mas isso não tira os méritos dos trabalhos impecáveis que elas lançaram, e nem do álbum do qual eu quero falar. Prima Donna, produzido pelo Sweetune, condensa toda a essência sexy e madura que o 9MUSES, na época com a sua melhor formação, teve durante esses quase 10 anos de história. A faixa-título que abre o álbum resume isso muito bem. 

Mas vamos falar de Gun, single dessa era e talvez um dos ápices do grupo na sua icônica singlegrafia. Pra gostar de Gun, a gente precisa manter a mente aberta como se estivéssemos vivendo no dia do lançamento porque não é o seu típico número EDM recheado de autotune como era comum de sair aos montes na época. Acho que por isso mesmo eu tenha acertado minhas contas com essa música tão tarde. Gun é uma delícia épica e elas sabem disso; tudo aqui converge pra criar um hit orgânico e extremamente sensual, como a guitarra sacana passeando pelo festival de trompetes, e os vocais que são contidos, mas ao mesmo tempo poderosos. É uma antítese excitante, que cria a expectativa pra algo acontecer, mas esse algo não acontece no tempo e jeito certos. 

De alguma forma, existe uma coisa meio sessentista aqui, como uma trilha sonora de um filme de espionagem. Rumor dá continuidade ao estilo, apesar de parecer uma escolha estranha depois da faixa anterior ser tão arrebatadora. Já eu acho um bom follow-up na tracklist; é como se essas bandas de mod tipo The Kinks, The Jam, The Who e afins se encontrassem com o kpop e tivessem um filho. A letra é uma demonstração explícita de feminismo, aos moldes coreanos, que dificilmente você encontraria em outros grupos da mesma geração. Eu particularmente gosto do verso que diz “ela fez cirurgia ou não?”/cuida da sua vida/você é tão abelhudo porque ele é engraçado ao mesmo tempo que expõe uma prática muito comum dos netizens. 

A Few Good Man é explosiva, mas com uma construção confusa. O que é uma pena porque a guitarra selvagem do começo da música é muito boa e só faz mais uma participação na ponte, muito bem executada entre a Sera e a Hyemi. Acho que ainda é um número que mantém a energia do álbum lá em cima, mas que eu não gosto tanto assim. Diferente de Last Scene, onde as coisas se invertem: temos uma balada R&B belíssima cujo começo é elegante o bastante pra cair facilmente no colo da Sade. Last Scene tem cheiro de cigarro e gosto amargo de uísque sem gelo, assim como uma decepção amorosa cheia de ressentimentos como a que elas cantam. Poucos grupos levariam um número sóbrio desses com a seriedade necessária.

Com Just a Girl, o álbum se perde um pouco e também perde alguns pontos comigo. É uma música mais calma, mas nem de longe consegue superar a faixa anterior, em nenhum aspecto. É mais um voz e violão que costuma cair no gosto do coreano médio e, bom, qualquer álbum de kpop investe numa dessas, mas com o 9MUSES parece algo bem bobo. A boa notícia é que, logo em seguida, vem o que deve ser uma das melhores músicas da carreira do grupo e talvez uma das melhores tentativas de emular os anos 80. Miss Agent é um thriller arrepiante do começo ao fim, com um instrumental apocalíptico todinho feito no sintetizador e que não soa genérico em nenhum momento. 

Acho bem inteligente o jogo de palavras que elas fazem aqui, não sei se pra fugir da censura ou algo assim. Fica claro que Miss Agent fala sobre um término, mas a escolha das palavras fazem com que a letra ganhe um duplo sentido e, em vez de somente apagar o amor da memória, elas querem uma oportunidade de literalmente apagar a existência a pessoa, como agentes secretas na calada da noite e que observam cada passo do seu alvo. O trecho que diz estou triste mas tudo bem/minhas lágrimas estão bem/eu vou te apagar esta noite é o maior indício disso, sobre amar tanto alguém a ponto de sobrepor seu principal objetivo (nesse caso, matar) e mergulhar num eterno conflito entre trabalho e sentimentos. 

Time’s Up evoca brilhantemente o ótimo trabalho que elas fizeram com o disco pop de Figaro dois anos antes, mas dessa vez com alguns elementos de EDM. Nada muito exagerado; o que dá o ritmo mais eletrônico é o drum and bass pulsante de fundo, mas logo a guitarrinha surge pra lembrar que não se trata de uma produção comum. E se você é daqueles que não gosta de rap desnecessário no kpop, a ponte incrível da Euarin e a Eunji pode te convencer do contrário; acho que poucas vezes souberam aproveitar o artifício em músicas que não obrigatoriamente precisam de um trecho de rap. A próxima é OMG, pronunciada como Oh My Gosh e, apesar de ter uma execução interessante que resgata essa memória de grupos mais antigos da primeira geração, destoa completamente da proposta do álbum. Não faria falta nenhuma na tracklist.

Retomando a excelente lírica misândrica, Ping é outro grande destaque. E o que faz ela ser tão boa é essa assinatura presente nas produções do Sweetune, de soar ridiculamente nostálgica mesmo se voltássemos pra 2013. Mais uma vez, Euarin e Eunji se revezam pra entregar as partes mais memoráveis da música, mas Ping é um show a parte em tudo que se propõe: a letra agressiva sobre uma mulher que acaba de descobrir uma traição combina demais com a aura melancólica de um instrumental puramente pop. 9MUSES ao extremo, daquilo de usar homens e decepções como artifício pra criar um puta hit, Ping é um dos exemplos do que eu mostraria pra alguém que quer conhecer kpop mais a fundo além dos singles.  

Encerrando o álbum, temos Whatever, dita em muitas reviews que eu li como uma faixa-filler. Acho um pouco injusto, já que Whatever fecha o Prima Donna de forma redondinha, sem furos, apesar do álbum não ter uma tracklist 100% perfeita. O grupo traz de volta o retrô, mas dessa vez bem mais genérico e lugar comum, o que não é necessariamente ruim. Acho uma ótima homenagem a Madonna no começo da carreira, inclusive, com um ritmo bem radiofônico. Afinal, se tem uma coisa que o 9MUSES fez muito bem durante todo o tempo de atividade — e a constante iminência de um tudo ou nada — foi aproveitar o que era comum e transformar em algo espetacular. Ou, ao menos, acima da média.

Nota: 8,5/10

Favoritas: Gun, Miss Agent, Ping

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4 comentários

  1. 9MUSES realmente se mostraram musas inspiradoras durante os seus 9 anos (que coincidência, hein?) de existência, tiveram muita sorte de terem ótimos produtores a disposição delas (apesar do destaque ser quase todo do Sweetune no fim do dia, mesmo). E ainda gostaria de ver suas reviews sobre outros dois minis das nossas queridas musas: o Sweet Rendezvous e o Love City (escuto os dois ATÉ HOJE)

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