Com o propósito de entregar as coisas sempre no prazo, cá estou comendo uma canja requentada e de banho recém-tomado pra estabelecer um termômetro das minhas músicas preferidas do ano a quem se interessar, ou não aguentar a espera por dezembro. Ou seja, ninguém em específico. Eu faço essas listas com o mesmo objetivo que eu faço outros posts aqui do blog, que é medir meu gosto e a minha escrita ao longo dos anos. Porque se tem algo que eu sou é volúvel e ter isso registrado é bem legal.
Aproveitando, assim como o Lunei observou na versão dele desse tipo de post, é muito engraçado como essas listas mais pessoais refletem nosso cotidiano. Percebi que costumo falar muito sobre os aspectos da vida, meu crescimento enquanto blogueirinha e, principalmente, o mundo ao redor. Por ter surgido em meio ao caos da pandemia, cada uma dessas postagens atuam como pequenas amostras da humanidade (no caso eu e as coisas que eu gosto). Costumo comentar sobre a agenda do pop asiático e as consequências trazidas por conta do coronavírus, como os lançamentos se atropelavam em 2021 e arrumaram uma brecha em 2022. Nesse ano, parece que tudo voltou ao normal, mas é meio estranho dar pra minha vida esse mesmo adjetivo.
Voltar pro escritório era uma das últimas coisas que passavam pela minha cabeça, ainda que estivesse lá, solta em algum canto. Ficar em casa me permitiu explorar sonhos antigos, como criar o AYO GG e estudar um assunto que eu, de fato, me interesse. Fez eu reconhecer quem são as pessoas que vão estar comigo independente do que aconteça, enquanto acabei me desconectando de outras que, queridas ou não, já não têm nada a ver comigo. A pandemia me tirou gente, física e emocionalmente, mas me trouxe coragem de seguir rumo à maturidade, alugando um apartamento que eu tenha orgulho de chamar de “lar”. E me fez adulta, apesar da idade. Mas voltar pra vida de horas de transporte público, computador lento, piadinha de chefe, almoço caro na zona sul de São Paulo e cansaço extremo era realmente a última coisa que eu esperava e queria.
E com isso, o AYO GG acabou ficando estacionado. Com bastante culpa, eu troco uma pauta interessante pela minha cama; os lançamentos do dia por um tempo com meu namorado. Muitas vezes, pop asiático é tudo o que eu menos quero por perto. Sentindo a idade bater, fico pensando se isso ainda é pra mim. Mas daí eu lembro de mim mesma três anos antes, com uma câmera e zero desenvoltura afim de falar sobre as melhores de 2020 pra me distrair do caos que foi o inventário do meu avô, falecido há dois meses. O embrião do AYO GG, genuíno e envergonhado, é o que, quase sempre, me dá forças pra continuar essa palhaçada. De chegar morta do trabalho e sentar por uma ou duas horas pra dar minha opinião sobre algo porque eu sei que, pelo menos, uma pessoa espera por mim. Eu sumo por dias e as views continuam estáveis, o que eu sou FODIDAMENTE agradecida.
Por isso eu fiz um esforço do tamanho do mundo pra cumprir o prazo do dia 4 de julho. Mal alimentada, com o cabelo pra secar e alguns freelas pra entregar, mas escrever sempre vai ser uma das minhas maiores paixões, daquelas tão fortes que vão morrer comigo. E, me baseando nisso, tentei deixar meu senso crítico de lado mais uma vez pra elencar as dez músicas que eu mais escutei ao longo dos meses, mesmo que alguns grupos se repitam ou que uma ou outra posição seja recente. 2023 tem sido um ano de emoções avassaladoras por aqui, e o que eu mais quero no momento é transmitir isso da forma mais verdadeira nos meus posts.
10. Lee Chaeyeon – Knock
O kpop é muito engraçado. Se no ano passado o debut da Chaeyeon foi uma das coisas mais broxantes que eu já ouvi, Knock bota o pau na mesa e mostra quem é a verdadeira all-rounder do morimbundo IZ*ONE. É como se ela tivesse acabado de estrear, mas com o fogo nos olhos de alguém que sabia desde o começo que não tinha sido devidamente valorizada até então. Knock aproveita todos os pontos ótimos da Chaeyeon e amplifica num instrumental divertidíssimo, dinâmico, que tem orgulho de brincar em várias camadas com a coreografia e a letra, enquanto ela mesma parece sair saltitando pelas notas do vocal adocicado. Se expor pros quatro cantos do Tiktok com 60 pessoas diferentes pra um tal challenge valeu demais porque, por uns bons meses, Knock foi uma trend pesada por lá e serviu pra botar a música ainda mais no meu radar.
09. fromis_9 – Attitude
Algo que o ano de 2023 tem servido com frequência e louvor são essas faixas bucetônicas. O fromis_9, com a saída da Gyuri, conseguiu sair um pouco do próprio template e, além de entregar o álbum mais consistente do kpop até o momento, abre seu novo trabalho com Attitude. É uma faixa anticlimática produzida com primor, cheia de tensão sexual num mundo distópico, talvez até uma versão muito mais certeira e arrebatadora dessa outra aqui. É estranho ver o fromis_9 nessa área cinzenta de lançamentos muito iguais e, ainda assim, gostar, mas esse é um típico caso de 1) um básico bem feito é sempre bem-vindo, e 2) quando o grupo se permite ousar, mesmo que seja o mínimo, costumam sair boas coisas. Attitude é uma daquelas faixas libertadoras e, com o perdão do trocadilho, cheias de atitude, tanto pra quem interpreta quanto pra quem ouve.
08. Billlie – enchanted night ~ white night
Poucas músicas conseguem contar uma história de forma clara e limpa, ainda que em outro idioma. enchanted night ~ white night é um ótimo exemplo de como capturar um conceito extremamente complicado e condensar num instrumental pra fazer a mensagem chegar do outro lado. Mesmo que eu não fale coreano, o Billlie consegue me contar através de sensações a noite em que elas perderam contato com a criança do vilarejo que tá presente na lore do grupo e que, se não fosse essa faixa, eu continuaria não dando a mínima. Toda a aura misteriosa que abriga o Billlie tá aqui pra quem se permitir levar, com todas essas viradas sombrias que retratam com exatidão o que deve ser perder uma pessoa querida de uma hora pra outra, com todas as camadas do luto caindo sobre você, o que conversa com acontecimentos recentes como uma forma de eulogia.
07. IVE – Blue Blood
De um jeito sarcástico, Blue Blood reúne algumas coisas que eu jurei nunca gostar no kpop: músicas curtas, refrões mecânicos e, principalmente, batidas étnicas. Eu não tinha curtido Eleven, então não tinha motivo pra eu gostar disso, mas a vida tem dessas e cá estou eu botando uma releitura da trilha sonora de O Clone em sétimo lugar. O que afasta Blue Blood do debut é que, dessa vez, o IVE tem um pouco mais de postura pra segurar uma música assim. Elas se sentem mais confortáveis em brincar com a entonação dos vocais e isso acaba dando a personalidade que Eleven precisava pra ser mais que uma estreia superestimada. Blue Blood é um desses casos de faixas fortes de abertura, que ditam o ritmo do álbum e o que a gente pode esperar também. Uma pena que, conforme a tracklist foi rolando, não passou de uma porção de descartes da Starship, mas elas mais que acertaram nessa daqui.
06. (G)I-DLE – All Night
No comeback mais recente, o (G)I-DLE meio que completou o ciclo de extremo interesse da minha parte e volta a ser um grupo que existe e é produzido pela Soyeon, mas não sem antes entregar All Night, composição sacana saída da ponta da caneta da Yuqi. Claro que outros milhões de atos acabam lançando uma assim em algum momento da carreira, mas o (G)I-DLE ainda tem aquele frescor da line-up ser uma mistura de vocais texturizados que dão uma vida a mais pra música. All Night é tudo o que a title poderia ter sido se a Soyeon não tivesse o ego maior que si mesma (o que não é muito difícil): um instrumental mais simples, contido, minimalista e que funciona do começo ao fim. Não sei se o grupo volta aos tempos nem tão distantes de números criticamente apelativos, mas no meio desse comeback todo, foi bom ter algo que se destacasse o bastante a ponto de dar as caras nessa lista.
05. IVE – I Am
Sim, é uma demo requentada da Ava Max, mas I Am me emociona de um jeito que só o IVE tem feito nos últimos tempos. É um pop fácil, comercial, quase beirando o irritante, mas que nunca de fato chega lá. O refrão, com uma harmonia duvidosa e recheada de autotune, me bota de joelhos. É como se a música me preenchesse por inteiro ao ponto da tensão superficial, onde uma gota a mais me faria transbordar e, talvez, estragasse a experiência. De tudo que saiu, I Am é o momento mais brilhante do IVE, onde elas sabem que são um grupo pop e nada além disso. Não diria que é a melhor, mas parece ser a mais cativante, aquela que é mais propensa a ser querida pela maioria, que pode tocar em qualquer lugar que arranca multidões. E, num geral, o IVE é especialista nisso de ter uma discografia altamente gostável. I Am chega pra dar um belo início a essa nova fase de lançamentos.
04. aespa – Spicy
Eu queria não ter gostado disso. Me forcei muito a não me importar tanto e ser mais um tapa-buraco na minha playlist, aquela música que eu jogo sem saber se eu curti mesmo e só o tempo vai me dizer. Mas Spicy é um hit instantâneo: a cada vez que toca, é como se ela comesse seus ouvidos de dentro pra fora. E vou dizer que, depois da deplorável Girls e toda a má condução dos dirigentes da SM, não achei que houvesse futuro pro aespa dentro do kpop. O que é doido de se pensar, já que a SM foi pioneira nesse negócio de grupos pop e esteve presente, de alguma forma, em todas as gerações. Mas, às vezes, largar o osso faz bem. E o osso da vez era a história cada vez mais sem pé nem cabeça de KWANGYA, quer dizer, o que essas coitadas vão fazer depois de matar uma cobra de CGI? Spicy prova que o aespa sabe ser só um grupo de kpop, e tá tudo bem estar “preso” nessa caixinha normal de vez em quando. De repente, ser mais do mesmo pode ser uma revolução.
03. aespa – Hold On Tight
E o aespa anda tão bom que é quase um universo paralelo. Essa dobradinha comprova isso; em que mundo eu poderia estar dando tanta atenção pra elas senão esse? Numa jornada parecida com a música anterior, Hold On Tight não tenta ser mais que um synthpop oitentista feito pra um filme duvidosamente bom, mas que, ao mesmo tempo, tem seu charme por conter elementos sutis do universo cibernético e distópico do grupo. Dentro dessa onda da SM, acho que Hold On Tight é, ironicamente, a faixa que mais se encaixa na proposta de forma genuína. Ela é misteriosa e carismática nas medidas certas, interpolando o tema do jogo Tetris brilhantemente, como se forças exteriores consumissem o instrumental a tal ponto que seja apenas fragmentos do que um dia foi Korobeiniki. É uma daquelas sacadas que, de tão simples, se tornam geniais.
02. LE SSERAFIM – Eve, Psyche & the Bluebeard’s wife
Falando em ideias simples, pegar o pedaço de uma intro já muito boa e usar de sample numa música mais elaborada fez com que o LE SSERAFIM lançasse o melhor kpop do ano até agora. Tem algo em Eve, Psyche & the Bluebeard’s wife que eu não sei explicar. É uma energia de bad girl completamente diferente de tudo que a Coreia do Sul já teve o desprazer de soltar e, de repente, parece que esse é o único jeito certo de parecer edgy. E isso entra em conflito direto com o fato dessas faixas serem o exato oposto do que o LE SSERAFIM fez aqui. Essa música é densa, e ela sabe disso. Tanto sabe que se aproveita dos ganchos onde ela soa mais pesada e deixa em loop até o nosso cérebro virar geleia. E o resultado é extremamente viciante. Por vezes, eu me pego fazendo a coreografia de forma involuntária simplesmente porque o corpo não obedece quando meu cérebro lembra da existência de Eve, Psyche & the Bluebeard’s wife.
01. ExWHYZ – Blaze
E isso acontece de forma semelhante com Blaze. O único jpop dessa lista consegue superar todos os lançamentos desse ano por ser um cataclisma em forma de música. É como se fosse uma festa no fim do mundo, onde todos estão prestes a morrer da forma mais catastrófica possível, mas ninguém realmente se importa porque todo mundo tá ali pra exorcizar os próprio demônios enquanto há tempo. Não consigo descrever muito bem a sensação que Blaze me causa. É uma das poucas vezes em que eu senti um instinto primitivo enquanto escutava uma música, como se chamasse meu animal espiritual pra brigar aqui fora. O ExWHYZ é um desses grupos periféricos do Japão que, com muita tristeza, não vão ser nada mais que isso, juntando um nicho de fãs aqui e ali, mas também é uma das únicas vezes que a WACK se levou a sério. E se coisas melhores do que Blaze surgirem mais pra frente, não sou responsável pelo dano permanente que isso pode causar na órbita do planeta.
Músicas aguardando a segunda chamada: Would You Run (Original Ver.), do TRI.BE; Wicked Love, da Yena; Kitsch, do IVE; EUNOIA, do Billlie; Ditto, do NewJeans; e Wallflower, do TWICE.
Vocês sabiam que agora eu vendo minhas artes? Lá na Colab55 tem algumas opções de produtos com estampas que eu fiz e você pode comprar pra ajudar essa pobre coitada que escreve o blog.
Acompanhe o AYO GG nas redes sociais:
