A essa altura, o surgimento repentino do NewJeans pode ser notícia velha. Vocês já devem saber que esse é um grupo da ADOR, um selo indie subsidiado pela HYBE e fundado pela artista visual e designer Min Heejin, que também já foi diretora criativa da SM por 16 anos. Ou seja, pra quem conhece o trabalho dessa mona, espera um produto visualmente impecável, fora dos padrões, com elementos inimagináveis e que fazem a gente se sentir idiota quando entende.
Dando uma olhada no NewJeans, dá pra entender o rebuliço; o visual extremamente apelativo e bem feito referencia os anos 2000 na sua melhor forma como nunca antes no kpop, desde a sonoridade aos produtos. Logo na estreia, a Min Heejin não poupou esforços pra fazer com que o NewJeans seja, no mínimo, memorável, apostando em nove versões físicas do EP e na produção de oito MVs. Além de um aplicativo chamado Phoning, desenvolvido pela Weverse com o mesmo objetivo de se comunicar com os fãs, mas exclusivo pra elas.
O primeiro MV a ser divulgado e que pegou todo mundo de surpresa foi o de Attention. E mais que o fator quase nostálgico de se postar um vídeo nos primórdios do Youtube sem nenhum tipo de promoção, esperando views orgânicas, foi a forma interessante como essa música se desenrola. Attention é muito contraditória. Nos seus primeiros segundos, um batidão meio Whip My Hair, da Willow Smith, cria tantas dúvidas na nossa cabeça quanto rugas de interrogação no rosto. A primeira impressão que eu tive foi de desespero por ter que ouvir mais um experimental pedante e horroroso. Só com isso, a música seria não só frustrante, como penosa.
Então, com um toque de mágica quase literal, surge um R&B gostoso que se mescla com essa batida maluca do começo, criando um número que ilustra perfeitamente aquele meme da Isabela Boscov, onde um lado seu mais racional e sensato não acredita que pode gostar daquilo, enquanto o outro mais instintivo ignora todas as críticas e se joga com tudo no que Attention proporciona. E é muito curioso como os trabalhos da Heejin na SM não saíram completamente das influências dela, já que a faixa poderia muito bem fazer parte do repertório do SHINee nos seus primeiros anos de carreira, o que é um puta de um elogio.
Attention é refrescante ao mesmo tempo que não cansa de surpreender. O refrão anticlimático, com todas as harmonizações e vocais adolescentes que não são estourados, é lindo. Isso passaria despercebido um tempo atrás, onde esse tipo de música era mais comum no kpop, mas hoje, com o cenário que nós temos, parece perfeito, como se a Terra voltasse ao seu eixo e a natureza evoluísse em abundância dizendo pra gente que tá tudo bem. Uma ótima estreia do NewJeans, e de quebra fez todo mundo voltar a enxergar um ponto de esperança no pop coreano.
Mas o que pegou a fanbase mesmo foi o tamanho da ambição em publicar QUATRO MVs pra Hype Boy, cada um abordando uma integrante, seus pontos de vista, pensamentos, amores e vida. Como música, Hype Boy se vende mais como mainstream. A melodia é bem chiclete, principalmente no refrão, e entrega um pop de fácil identificação e gosto. Isso não faz com que a faixa pareça genérica; eu também gosto de como Hype Boy evolui e de como ela veste bem essa proposta de verão mais calmo no kpop, mas comparando com Attention, ela pode parecer menos genial visando o projeto todo.
Como são quatro MVs, acabei escolhendo o que levantou uma das polêmicas acerca do conceito do grupo. Em uma das cenas, uma das meninas tá com um pirulito e oferece pra outra enquanto o penteado e o gesto em si lembram o filme Lolita, do Stanley Kubrick. A história é bem conhecida e igualmente problemática, levantando hipóteses de que a Heejin estaria sexualizando essas garotas junto a outras evidências de quando ela trabalhava na SM, principalmente com o Taemin menor de idade. Eu até tenho uma opinião sobre isso, mas vou deixar mais pra frente no post.
Voltando a Hype Boy, a ideia de criar um MV para cada menina foi ousada e arriscada, mas com a visibilidade positiva pra cima de Attention (fora todo o contexto de ser subsidiada pela HYBE e postar no canal deles) acabou vendendo a história montada pro NewJeans e, subsequentemente, vendeu o rosto das meninas também, dando profundidade pra todas elas em interpretação, atuação e popularidade. No final, foi divertido acompanhar esse desabrochar de um primeiro amor e também a diversidade que esses amores representam.
No dia seguinte, tivemos Hurt, que faz o papel de baladinha no EP. E, bom, sendo uma baladinha R&B, nunca tenho muito pra falar sobre, mas é agradável de ouvir, ainda mais com os vocais acompanhando a percussão, o que dá um dinamismo pra faixa. E, mesmo que ela seja essa música mais lenta e adocicada, Hurt ainda cumpre os objetivos do conceito de ter um enredo com essas adolescentes, como se estivéssemos entrando na vida íntima delas, vendo cada uma mostrar seus medos e inseguranças.
Fiquei chocada com o fato de Hurt ser a última das músicas do grupo nos charts porque é o tipo de som que faz a cabeça do coreano médio, ainda que não seja uma balada artificial que ocupa espaço como a maioria dos atos do kpop fazem. Talvez, nessa estética mais alternativa e “anti-idol”, Hurt não faça tanto sentido porque as outras músicas acabam seguindo pelo mesmo caminho e possuem diferenciais que as façam se destacar, mas no geral é uma boa adição. Todo grupo iniciante precisa de uma dessas na discografia.
E chegamos a última faixa do álbum, que é o single principal do EP. Cookie saiu ontem e, nossa, a identificação com o Red Velvet foi imediata, com essa sonoridade sensual, velvet, mais uma vez provando as influências que a Heejin carrega da antiga empresa. Só que tem um porém: além de não ser tão boa a ponto de virar title, acho que a música é um tiro que saiu pela culatra por conta das referências sexuais em toda a letra. Se fosse só o R&B com uma composição mais bobinha ou condizente com a idade delas, tudo bem, mas não gosto de como as coisas vão se encaminhando a partir do momento que eu leio o que elas cantam, assim como não gosto do eufemismo aplicado pra tentar deixar menos problemático.
Enfim, estruturalmente, acho Cookie chatinha. Não é forte o suficiente pra ser capa de um EP visual (e que visual), então acaba não fazendo jus ao conceito todo. Era o momento de ser um pouco mais audacioso, investir no instrumental sem tirar o foco da imagem alternativa. Sei lá, ao mesmo tempo que não curti, também não consigo imaginar de outra forma, o que é uma pena porque isso me afasta da música, apesar do MV ter um diferencial e ser super bem dirigido. Não sabemos o que será do futuro do grupo com essas acusações de sexualização de menores, mas o NewJeans conseguiu em poucos dias duas coisas muito importantes: apagar a relação da Kim Garam com a HYBE e recuperar a nossa fé no kpop.
Acompanhe o AYO GG nas redes sociais:
Se você gosta muito do AYO GG e quiser transferir uns trocados pelo Pix, utilize a chave rafaellasolla@hotmail.com.