Obs.: no Instagram dela, é possível ver que existem dois pronomes pelos quais ela gosta de ser atendida, que é she/they. Aqui nesse post, eu me dirigi como “ela” o tempo inteiro, mas isso não invalida a declaração que ela deu no ano passado sobre seu gênero.
Utada Hikaru dispensa apresentações, eu acho. A artista que ocupa três posições dos dez álbuns mais vendidos do Japão, sendo uma delas um primeiríssimo lugar inabalável desde 1999, e que segue alcançando números fantásticos mesmo depois de anos de carreira, é, no mínimo, memorável. E a bicha veio apostando alto no lançamento do seu oitavo álbum de estúdio.
BAD Mode, nome do single e do álbum, marca a estreia de uma nova fase da vida de Utada, que muita gente julgou caseira demais por conta da capa que ela escolheu, com o filho dela correndo no meio da foto, e pelas prévias de músicas lançadas anteriormente. Mas o teaser de BAD Mode deixou uma ótima primeira impressão, então fiquei ansiosa pra escrever uma review sobre.
Vamos descobrir se a espera valeu a pena depois do MV.
Por alguns anos (os últimos, principalmente), a Utada não soube bem se equilibrar na linha entre o pretensioso e o chato, e os lançamentos sempre pendiam pra um desses lados. O Hatsukoi foi essa definição levada ao máximo; não dá pra sentir a Utada ali, em nenhuma faixa, e essa sensação de inexistência continuou pairando sobre as composições dela por muito tempo. A exceção foi Kimi ni Muchuu, que saiu no ano passado e figurou no meu ranking de melhores, onde ela já dava indícios de ter se reencontrado dentro das suas influências musicais.
BAD Mode é a Utada terminando de aparar as arestas que deixou com as tentativas (e erros) dos últimos singles, aos moldes do que ela já lançou nos seus anos de auge, ao mesmo tempo que se mistura com essa persona mais madura nos seus quase 40 anos e mãe (hoje) solo. E disso tudo saiu uma música quase perfeita, daquelas que tem o momento exato pra surgir e ser lançada, tanto pela experimentação de gêneros ao longo de cinco minutos, quanto pelo conteúdo da letra, uma das mais sinceras que ela já escreveu.
Essencialmente, BAD Mode é um número meio jazz, meio urban, que vai crescendo e crescendo em cima de pianos e linhas de baixo que dão uma textura super interessante pra faixa. Porém, é importante notar que a estrutura dessa música tem um propósito, e é aí que a inteligência da Utada mora. BAD Mode fala sobre amar tanto alguém a ponto de desistir de qualquer julgamento apenas pra fazer o outro se sentir bem. E nisso, o refrão que oferece um diazepam ou simplesmente “bolar um”, brilha instantaneamente por camadas alegres de trompetes.
Só que, a partir da metade, a faixa mergulha num introspecto tão grande que praticamente se torna uma música ambiente. E isso vem depois da Utada dizer que só resta rezar pras coisas não se transformarem no que foi da última vez; daí fica a cargo de quem ouve dizer o que quer dizer essa parte. Uma reflexão da Utada sobre a sua própria frase? A espera pela outra pessoa voltar a se sentir bem depois de sugerir ficar o dia inteiro de pijama, pedir um Uber Eats e tomar banho juntos? Foi um artifício tão legal, é como se eu mergulhasse em um sonho enquanto eu to sonhando, tipo em Inception. O jazz dá lugar a uma corrente de água e sintetizadores espaciais, enquanto a voz da Utada flutua pelo ambiente até a música recuperar o fôlego aos poucos.
Ver a Utada recuperando a sua veia artística sem parecer prepotente é uma das melhores coisas que aconteceram nesses últimos três meses. BAD Mode é a síntese de tudo isso, uma nova fase começando com o pé direito, expondo seu lado mais amadurecido e sem esquecer das origens que formaram a artista que ela é hoje. Ouvir Utada Hikaru sempre é uma experiência por si só, mas essa é a música mais verdadeira e mais Utada Hikaru que ela já entregou em anos. É sempre um desafio maravilhoso ver uma veterana se superar.
Escute também: Find Love
Apesar de ter 14 faixas, BAD Mode carrega mesmo quatro músicas inéditas, além de dois remixes que já tinham no EP One Last Kiss, mais um remix de Face My Fears (que é o grande fator broxante do álbum todo) e a versão japonesa de Find Love. Mas qualquer uma das duas que você for ouvir tá ótimo, porque o instrumental dessa música é incrível. É como uma festa triste, daquelas que você dança sozinho sentindo cada nota pulsar no seu corpo tomado por uma melancolia aparentemente sem fim. O sintetizador muitas vezes trabalha sozinho dando apoio à voz dramática da Utada, cada vez mais perdido, até desembocar numa linha de baixo profunda. É a verdadeira definição de “essa festa virou um enterro”, mas eu amo essas músicas que começam animadas e terminam gatilhando minha depressão. Recomendo bastante.
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Realmente boa, e o que me impressionou foi que as outras músicas desse álbum que ainda não tinham sido lançadas são AINDA MELHORES! A com mais de 11 minutos, pra minha surpresa, flui extremamente bem, dando pra escutar do começo ao fim sem achar cansativa.
Estava achando que esse álbum ia ser um desastre, com a capa “conceitual”, metade da tracklist sendo faixas já lançadas há meses (algumas das quais tinham deixado a desejar), o tempo de duração incomum de algumas músicas… mas felizmente, Utada pegou toda essa bagunça e ainda assim conseguiu transformar ela num álbum muito bom!
Tomara que o álbum que a Koda Kumi já anunciou pra esse começo de ano também seja uma surpresa positiva. Acho que os EPs angeL + monsteR foram o único álbum bom dela (contando os dois EPs juntos como um álbum) nos últimos anos, em meio a vários álbuns oscilando entre medíocres e ruins…
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Adorei o texto! Essa música é incrível mesmo, apesar de que a faixa numero 2 do álbum acabou roubando minha atenção. Eu sou louco por melancolia e a segunda faixa me dá essa vibe!
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kimi ni muchuu entrou no meu top 100 ano passado! gosto bastante até hoje
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