[SabadOFF] Um especial sobre o mês das mulheres

Mais um final de mês se aproximando e, consequentemente, mais um SabadOFF saindo do forno. Essa edição de março tá quentinha porque eu comecei a escrever no mesmo dia da postagem, eu me confundi com os dias do mês e jurava que o último sábado seria no mesmo dia do debut da Jisoo e fiquei me perguntando o que fazer. Mas no fim deu tudo certo e, depois de alguns dias pensando qual tema eu abordaria, não consegui fugir pra muito longe e decidi seguir o previsível: falar sobre mulheres que eu admiro no mês das mulheres. 

Primeiro, eu achei que seria legal listar momentos de interação entre a minha mãe e eu, mas guardei pra usar em maio. Aí veio a dúvida de listar dez mulheres que eu admiro, mas já tava em cima da hora e eu não queria que o post ficasse raso ou corrido, ou até esquecer mulheres que eu gosto de verdade em prol de outras que eu fui lembrando de maneira desesperada. Então, no fim da peneira, eu fiquei com três figuras famosas que me inspiram de verdade, em momentos diferentes da minha vida, mas sempre presenças constantes. São personalidades que eu diria de prontidão caso me perguntassem, sei lá, no meio da rua. Sem ordem de preferência.

Yayoi Kusama (n. 1929)

Artista plástica, escultora, escritora, pintora, performista, designer de moda

A mídia costuma colocar a Kusama em caixas, o que eu acho um erro. Tanto que, pra descrever todas as coisas que ela já fez ali no subtítulo, eu fiquei em dúvida. Essa mulher, assim como a sua arte, é ilimitada, uma explosão de coisas infinitas dentro de um espaço infinito na infinidade da vida.

É tão pequeno quanto um grão de areia descrever Yayoi Kusama como “uma artista japonesa que pinta bolinhas, é esquizofrênica e mora num hospital”. Poucos sabem que ela sofreu abusos por parte dos pais. Sua mãe, extremamente violenta e vivendo um casamento infeliz, usava a filha pra espiar o pai tendo relações com outras mulheres. Por muito tempo, ela mesma declarou que odiava sexo, mas ao mesmo tempo era obcecada por formas fálicas. E as suas alucinações, que logo depois viraram peças de arte, eram seu refúgio em meio ao trauma familiar.

Foi quando saiu do Japão aos 27 anos que Kusama encontrou o que precisava pra seguir fazendo arte e, posteriormente, liderando um movimento vanguardista em solo estadunidense, atraindo a atenção de colegas do meio e críticos especializados. Vocês sabiam, por exemplo, que o famoso Andy Warhol, aquele que “inventou” a pop art, plagiou uma das esculturas dela? Não foi a única demonstração de racismo, xenofobia e sexismo que Kusama enfrentou enquanto mulher amarela e artista. Foram situações assim que a levaram a algumas tentativas de suicídio, desacreditada do seu potencial infinito de mudar os rumos da arte.

Kusama é um ótimo exemplo de força feminina disruptiva. Ela desafiava a sociedade ocidental, que se dizia tão avançada, ao lutar pelos direitos dos LGBTQIA+ quando essa sigla nem ao menos era cogitada, o que rendeu um protesto repudiante do seu antigo colégio no Japão ao retirar seu nome da lista de alunos. Ao retornar ao Japão, passou a morar em um hospital em Tóquio e ficou fadada ao esquecimento, até voltar a ser celebrada a partir dos anos 80 como liderança contemporânea e subversiva. Falando abertamente sobre saúde mental, Kusama é uma das artistas mais respeitadas do Japão e do mundo, abrindo suas entranhas pontilhadas pra quem quiser conferir. 

O meu trabalho é uma expressão da minha vida, particularmente da minha doença mental.

Elza Soares (n. 1930, m. 2022)

Cantora, compositora, puxadora de samba

O ser do planeta fome. A mulher do fim do mundo. A voz do milênio. Dona de milhares de nomes e identidades, Elza Soares é uma das maiores cantoras do mundo e não é à toa. Desde o fatídico dia da apresentação no programa do Ary Barroso, até a última nota que soltou na sua última (e conhecida) aparição ao vivo, Elza foi resistência, sempre dando voz às camadas mais maltratadas da sociedade. 

Apesar de ter seus documentos registrados com o ano de 1930 como seu nascimento, Elza acredita ter nascido depois disso, pois lembrava-se de ainda ser uma criança quando foi obrigada pelo próprio pai a se casar com um amigo que havia abusado dela como forma de “resgatar sua honra”. Aos 21 anos, era mãe de quatro filhos e havia perdido mais dois, que nem haviam sido registrados, para a desnutrição. Nessa mesma época, usou um vestido enorme da própria mãe para cantar no programa de talentos do Ary Barroso, onde, ao ser questionada com deboche de qual planeta tinha vindo, proferiu uma de suas frases mais famosas: “Do mesmo planeta que o senhor. O planeta fome”. 

Elza sofreu muito. Além do episódio do abuso sexual, se casou com o então jogador Garrincha, que era alcoólatra. Recebeu a notícia da morte da sua mãe no carro do marido quando, horas antes, tinha pedido pra que ele não fosse visitar as filhas por conta de um mau pressentimento. Seu filho, Garrinchinha, morreu da mesma forma aos nove anos. Teve sua casa invadida pelo DOPS no começo da ditadura. Sua filha foi sequestrada pelo casal que cuidava dela enquanto Elza ia trabalhar fora, e só se reencontraram 30 anos depois, quando o crime já havia prescrito. Sofreu uma queda em 1999 num show e nunca mais conseguiu andar sem dificuldades. Era agredida constantemente por Garrincha e Alaordes, seu primeiro marido, que a proibia de sair de casa. Perdeu quatro filhos ao longo da vida. 

E, ainda assim, levantava as bandeiras de causas que havia vivenciado na pele, sendo a voz daqueles que mais precisavam. Em 2015, depois de 65 anos flertando com vários gêneros e dando sua interpretação única de diversas composições famosas, Elza reinventou sua carreira, lançando A Mulher do Fim do Mundo, seu primeiro álbum de inéditas. Letras viscerais apresentavam um Brasil ainda ofuscado pela grande mídia, transformando Elza num estandarte dos oprimidos, e que ainda vai ser muito bem lembrada pelos próximos 100 anos. 

Mil nações moldaram minha cara; minha voz, uso pra dizer o que se cala.

Frida Kahlo (n. 1907, m. 1954)

Pintora e ativista

Impossível não lembrar de Frida Kahlo sem desenhar na mente a imagem de um par de sobrancelhas grossas e uma coroa de flores que adorna o cabelo perfeitamente preso num coque. Hoje uma figura emblemática do movimento feminista (deturpada principalmente pelas liberais), Frida é muito mais que uma personalidade mercantilizada em camisetas. E eu entendi isso há pouco tempo indo na exposição em cartaz aqui em São Paulo.

É importante lembrar que, apesar de ter contraído poliomielite ainda quando criança, não foi o que fez com que Frida ficasse confinada em uma cama, mas foi a razão pela qual ela passou a vestir saias longas, uma de suas maiores marcas até o fim da vida. O motivo foi o tamanho de suas pernas, sendo a direita menor e mais fina que a esquerda. Desde a infância, ela sempre esteve ligada às artes, mas entrou na ENP com o objetivo de se tornar física. Inclusive, foi uma das primeiras mulheres a serem aceitas na instituição. Com espírito rebelde desde pequena, Frida logo se envolveu com o ativismo político. 

Foi em 1925, ao fazer um desvio no caminho costumeiro pra procurar um guarda-chuva, que Frida sofreu o acidente que mudaria pra sempre o seu destino. Segundo os especialistas da época, sua sobrevivência poderia ser considerada um milagre, já que o corrimão do ônibus onde estava atravessou seu corpo, da coluna até a vagina, perfurando o abdômen e o útero no processo. Frida ficou acamada por três meses e passou a observar a vida através da janela do quarto. Sua mãe decidiu instalar um cavalete ao lado da cama pra que ela pudesse pintar, o que originou sua trajetória como pintora, retratando sua luta diária contra as dores físicas e emocionais que sentia diariamente. 

Mesmo permanecendo ativa até o fim da vida, explorando diferentes técnicas e estilos de pintura, e tendo uma passagem bem significativa nos EUA, as obras de Frida permaneceram na obscuridade até o final dos anos 70. A partir daí, ela se tornou um símbolo “extrartístico”, sendo figura representativa de movimentos sociais pela sua associação ao Partido Comunista Mexicano e a bissexualidade assumida mesmo durante seus anos casada com o também pintor Diego Rivera. Para além de um ícone, Frida carregou na carne as dores da vida e transformou em revolução. Por isso é importante manter viva a memória de que ela significa infinitamente mais do que tudo que ela estampa hoje. 

Pés, para que os quero, se tenho asas para voar?

Vocês sabiam que agora eu vendo minhas artes? Lá na Colab55 tem algumas opções de produtos com estampas que eu fiz e você pode comprar pra ajudar essa pobre coitada que escreve o blog.

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